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terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

QUANDO TUDO PARECE DESMORANAR

 

Quando tudo parece ir para o fundo do poço, é preciso parar para organizar os pensamentos, o raciocínio, as sensações. Estas, na verdade, organizam-se ou se destrambelham, conforme o estado daqueles. Quando é que tudo parece estar a desabar? Uma percepção assim parece estar associada ao quadro que pintamos de nossa situação. Da forma como o mundo é visto, os acontecimentos, a própria situação, pode-se ter sensações ruins ou boas. Se você se vê caindo, sua sensação não será boa. Mas se você vê sua situação em bom estado, como é desejada, sua sensação é de satisfação.

Por este prisma, estaria eu a dizer que as sensações sempre acontecem em  decorrência dos pensamentos? Talvez, mas não necessariamente. O fato básico é que uma visão de uma suposta realidade pode apresentar uma ilusão que, depois de certa reflexão e rearranjo dos pensamentos e raciocínios, pode ser desfeita ou mudada, sem dúvida.

No mais das vezes, estamos tão absorvidos pelos acontecimentos do dia-a-dia, que não percebemos em que estado emocional estamos a adentrar. São tantas "vozes" em nossa mente (você tem que pagar... tem que vender... tem que ir... tem que  vir... tem que fazer isso, aquilo ou aquiloutro...) que esquecemos de nos afastar deste vozerio, criar um distanciamento desta situação para que possamos orientar os nossos pensamentos e reflexões. Daí a concepção da grande necessidade da meditação ou de um momento de silencio, de isolamento, para que possamos ouvir-nos e entender que há ainda condições de uma reorientação para a nossa vida. O desespero é sempre uma alternativa desprezível. Esta era a concepção do escritor bíblico quando refletiu: "Por que estás abatida, ó minha alma, e por que te perturbas dentro de mim? Espera em Deus, pois ainda o louvarei" (Salmo 42:11). Na ausência de alguém que lhe desperte de uma condição malfazeja, na qual você se encontra, faz-se necessário que você mesmo se alerte contra o perigo de se entregar às possibilidades de uma depressão. Para isso, comece procurando acalmar-se, buscando reorientar os seus pensamentos. Aprenda a meditar. Se ainda não aprendeu como realizar este autobenefício, busque ajuda. Ainda há tempo.

Willians Moreira Damasceno

domingo, 26 de fevereiro de 2012

FRIEDRICH SCHLEIERMACHER E A HERMENÊUTICA

 

            Do entendimento de todas as teologias podemos concluir que a questão hermenêutica é consideravelmente decisiva. Toda teologia possui em seus bastidores uma maneira peculiar de se compreender a realidade. Essa maneira, ao teólogo peculiar, condiciona a teologia.

            A palavra hermenêutica é de origem grega, significando interpretação. Seu significado está vinculado ao deus Hermes, mensageiro dos deuses, intérprete das mensagens divinas. Na verdade, o termo aponta para a arte ou técnica de interpretar. Essa arte possui regras que guiam a interpretação dos textos.

            Faz-se distinção entre hermenêutica e exegese. Hermenêutica é a teoria da interpretação e exegese atém-se à prática da interpretação. A exegese é a aplicação da hermenêutica no estudo do texto, buscando a compreensão do que o autor quis transmitir aos receptores da sua mensagem.

            Segundo estudiosos do assunto, cinquenta anos antes de Nietzsche, o filósofo e teólogo protestante Friedrich Schleiermacher (1768-1834) iniciou uma reflexão sobre hermenêutica que o tornou conhecido como fundador da hermenêutica moderna.

            Àquela época, não existia ainda algo como uma hermenêutica geral que fosse uma arte do compreender; existiam diversas hermenêuticas especiais. Schleiermacher fará a hermenêutica independer-se de suas especialidades, tornando-a a teoria geral do compreender. Segundo Gibelline[1], torna-se instrumento geral das ciências do espírito.

Schleiermacher descobriu que a Bíblia não possui tratados teológicos sistemáticos e, sim, é o produto de homens dando respostas a situações concretas. Daí a necessidade de se conhecer a vida do escritor e o que está por trás das suas palavras[2]. Sendo assim, é fácil entender que muito da atividade exegética (estudar o contexto cultural de um texto bíblico para podermos conhecer a sua mensagem para a época em que foi escrito) é, a princípio, uma atividade fundada na perspectiva de Schleiermacher.

Schleiermacher fez distinção entre interpretação gramatical e interpretação psicológica. A interpretação gramatical passa por uma atividade linguística-lexical; enquanto que a interpretação psicológica é a atividade de se procurar compreender a mente do autor expressa pelo texto escrito. A necessidade de uma análise filosófica das condições que tornam possível o entendimento do texto é fundamental no método de Schleiermacher. O caminho de elaboração do texto percorrido pelo Criador original é fruto da perspectiva e da vida pessoal do autor numa situação social que abrange a situação particular na qual o texto é criado.

Alguns críticos dizem que Schleiermacher foi influenciado pelo movimento romantista quando entende como possível um intérprete chegar a uma habilidade de recriar a mente do autor de um texto. Certamente isso é questionável.

Segundo o teólogo Bernard Ramm, citado no livro Teologia Contemporânea de Stanley Gundry, Friedrich Schleiermacher foi o pioneiro na reconstrução da teologia mediante o uso de uma base filosófica. Trabalhou este filósofo e teólogo fundado no idealismo alemão de Immanuel Kant (1724-1804), um dos fundadores teoréticos do liberalismo teológico.

            Os estudos hermenêuticos têm passado por várias transformações desde Schleiermacher até os nossos dias. Principalmente para as mentes influenciadas pela pós-modernidade, a realidade hermenêutica está vinculada não somente àquelas considerações feitas por Schleiermacher, mas a uma série de outras considerações que abrem um leque de interpretação extremamente sugestivo.

O teólogo precisa, pois, ter uma noção adequada da realidade hermenêutica do seu trabalho para não se enredar em situações de desconforto exegético, precisando refazer todo o seu trabalho, muitas vezes sem necessidade de que isto aconteça.

Willians Moreira Damasceno


[1] GIBELLINI, Rosino. A teologia do século XX. São Paulo: Edições Loyola, 1998. 591 págs.

[2] Compreensão que a pós-modernidade não adota.