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quarta-feira, 24 de junho de 2009

CONFUSÕES FILOSÓFICAS

DIFERENÇAS ENTRE ALGUMAS CORRENTES FILOSÓFICAS

 

Desde a minha adolescência, tive contato com opiniões as mais diversas sobre correntes filosóficas. Tanto por parte de indivíduos bem informados, como também por parte de mal informados; sem contar com as opiniões veiculadas por indivíduos desinformados, mas que se aventuram, por presunção, a opinar sobre o que não conhecem. Tenho lembrança de muitas justiças e injustiças que foram feitas, e ainda acontece, a correntes filosóficas: ceticismo, agnosticismo, epicurismo, hedonismo, estoicismo, etc.

Com o passar do tempo, as confusões vieram a me incomodar mais e mais. Tanto assim que resolvi, afinal, expor o meu parecer sobre o assunto, procurando fazer esclarecimentos que entendo sejam pertinentes. Claro deve ficar que me dirijo não aos no mínimo graduados, mas à grande maioria que opina sem o devido conhecimento de causa. Se algum avisado sobre estes assuntos entender que é viável corrigir-me em algo, que o faça.

 

Começo pela distinção entre ceticismo e agnosticismo. Sobre estas correntes, ouvi algumas opiniões que faziam a devida diferença entre ambos e opiniões que faziam confusão entre os mesmos. A grande maioria foi de opinião que fazia confusão. É praticamente óbvio que a confusão está mais arraigada entre os mal informados sobre assuntos filosóficos e também entre leigos que opinam fundamentados em achismos a partir de argumentos terceirizados.

Entre o Ceticismo e o Agnosticismo o problema básico que a mim se apresentou nas opiniões ouvidas refere-se ao aspecto epistemológico. E neste ponto a diferença é gritante, embora não seja vista pelos ignorantes. A confusão está em tomar um pelo outro, entendendo que ambos ensinam que é impossível ter conhecimento. Ou seja, na visão do senso comum, a marca registrada do cético e do agnóstico é a incredulidade; interpretação esta na linha do biólogo britânico Thomas Henry Huxley, o qual identificou o agnóstico com alguém que acredita que o conhecimento de Deus é impossível. Deste ponto a estender o conceito a outras esferas do conhecimento houve um caminho curtíssimo. Passou-se a chamar de agnóstico, ou mesmo cético, a qualquer pessoa que afirma não acreditar em algo que outros acreditam. Perceba-se assim que há um ponto a frisar nessa história. O agnóstico é aquele que afirma a impossibilidade do homem alcançar o conhecimento da realidade; se não em todas as esferas da existência, pelo menos em relação a muitas. Assim se encontra o agnóstico em relação a disciplinas como: ciência, história, religião, e em relação a muitos outros ramos do conhecimento.

Estabelecido o agnóstico dessa forma, fica fácil conceituar o Ceticismo.

Historica­mente, arvora-se Sexto Empírico, filósofo grego que viveu entre os séc. II e III d. C, em seu texto: Hipotiposes Pirrônicas. No primeiro capítulo, o autor é objetivo ao estabelecer três filosofias abrangentes. Uma filosofia que afirma a possibilidade de o homem chegar ao conhecimento verdadeiro do objeto pesquisado; outra que afirma ser impossível apreender o objeto de estudo, ou seja, a impossibilidade do conhecimento; e outra que afirma que o imperativo é a continuação da busca do conhecimento, pois que ainda não é possível afirmar-se o conhecimento ou o não conhecimento da realidade. Aos filósofos da primeira filosofia, Sexto chama-os de Dogmáticos, e identifica alguns: Aristóteles, Epicuro, estóicos, e outros; aos da segunda, Sexto chama-os de Acadêmicos; e aos filósofos da terceira, chama-os de céticos. Observe-se, pois, que a distinção está nítida. O cético afirma a continuidade da pesquisa. O cético não afirma crença nem descrença alguma. O cético está sempre aberto às possibilidades de sua busca de conhecimento. Para o cético, a dúvida é a fomentadora da busca do conhecimento.

Conclua-se então que, epistemologicamente, a diferença é grande entre o agnosticismo e o ceticismo. Enquanto este afirma a continuidade do estudo com possibilidades as mais diversas de conclusões, e estas nunca absolutas, pois que sempre é possível uma nova descoberta sobre um mesmo fenômeno, aquele afirma categoricamente a impossibilidade de se conhecer coisa alguma. Logo, é impróprio dizer-se que o cético é um incrédulo. Da mesma forma que não é também um crédulo. O cético nem afirma nem nega a existência de Deus; este assunto é sempre uma questão para estudo. Da mesma forma, o cético se porta em relação a outros fenômenos. Se alguém é incrédulo nessa estrada, esse é o agnóstico; nunca o cético.
Willians Moreira

domingo, 21 de junho de 2009

VIOLÊNCIA DE LÁ E VIOLÊNCIA DE CÁ

Violência entre os humanos é algo merecedor de reflexão.

Após ouvir a reportagem sobre o massacre de um homem que foi se encontrar com um amigo após a Parada Gay, por cinco outros homens, em São Paulo (junho / 2009), veio-me à mente a lembrança do relato que logo em seguida disponho para os leitores deste blog.

 "Vinte anos antes de nossa viagem ao centro do Zaire, no começo da tarde de 7 de janeiro de 1974, no parque Nacional de Gombe, na Tanzânia, um grupo de oito chimpanzés se deslocava de forma decidida para o sul, na direção dos limites de seu território. Forma­vam um bom grupo de combate: sete machos - seis deles adultos e um adolescente. Havia o macho predominante, Figan. Havia também seu rival, Humphrey. A única fêmea do grupo era Gigi. Sem filhos e bastante rija, ela não os retardaria.

Enquanto caminhavam, ouviam à sua volta chamados da comunidade vizinha, mas não berraram nem gritaram em resposta. Ao contrário, mantiveram um silêncio inusitado e apertaram o passo. Chegaram à faixa limítrofe de seu território, mas não para­ram. Em pouco tempo, estavam além de sua área habitual, movendo-se silenciosamente pelo território dos vizinhos. Mantendo o mesmo ritmo, acompanhava-os Hillali Matama, o principal assistente de campo do centro de pesquisas de Jane Goodall em Gombe.

Perto do limite do território vizinho, Godi, sozinho numa árvore, comia placidamente. Godi era um macho comum, um adulto jovem, com cerca de 21 anos, membro da comunidade chimpanzé de Kahama. Havia outros seis machos em Kahama, e aqueles chamados emitidos antes lhe haviam indicado onde estavam alguns dos seus companheiros. Na maioria das vezes, deslocavam-se todos juntos. Hoje, porém, Godi tinha resolvido comer sozinho. Um erro.

Quando viu os oito intrusos, eles já estavam junto de sua árvore. Deu um salto e correu, mas seus perseguidores correram atrás dele, os três da frente ombro a ombro. Humphrey alcançou-o primeiro, agarrando-lhe uma perna. Desequilibrado, Godi trope­çou em seguida. Humphrey saltou sobre ele. Com todo o peso de seus 50 quilos sobre Godi, prendendo-o no chão como um lutador de judô, segurando suas duas pernas, Humphrey o imobilizou. Godi ficou deitado, impotente, a cara enfiada na terra.

Enquanto Humphrey o segurava, os outros machos atacaram. Estavam excitadíssimos, gritando e atacando. Hugo, o mais velho, mordeu Godi com dentes já corroídos quase até as gengivas. Os outros machos adultos esmurraram suas omoplatas e costas. O ado­lescente ficou olhando de uma certa distância. A fêmea, Gigi, ficou dando voltas em torno do ataque, gritando. (Imagine-se sendo surrado por cinco pugilistas pesos-pesados e terá uma idéia de como Godi deve ter se sentido: Testes de medição provaram que mesmo os chimpanzés cativos, em más condições físicas, têm de quatro a cinco vezes mais força do que um atleta em plena forma.

Passados 10 minutos, Humphrey soltou as pernas de Godi. Os outros pararam de bater nele. Godi ficou deitado na lama, de cara para baixo, e lhe jogaram uma pedra grande em cima. Em seguida, ainda alucinados de excitação, os atacantes penetraram rapidamente mais para o interior do território de Kahama, soltando grunhidos arfantes e correndo. Alguns minutos depois, voltaram para o norte e cruzaram de novo a fronteira do seu próprio território. Godi, erguendo-se lentamente, berrando de medo e sofrimento, ficou olhando seus algozes irem embora. Sua cara, corpo e membros tinham ferimentos horríveis. Estava seriamente machucado. Sangrava por dezenas de talhos, cortes e perfurações.

Nunca mais foi visto. Pode ter vivido mais alguns dias, talvez uma semana, ou duas. Mas, certamente, morreu.

O ataque a Godi foi uma estréia. Sem dúvida essa não era a primeira vez que os chimpanzés faziam um ataque ao território vizinho contra um inimigo, mas foi a primeira vez que um obser­vador humano presenciou o fato. É o primeiro caso registrado de ataques mortíferos no meio dos chimpanzés e, no círculo dos observadores de chimpanzés e de cientistas que estudam animais de forma geral, isso levantou uma questão muito importante.

Não se esperava que esse tipo de coisa ocorresse entre não-humanos. Até o ataque a Godi, os cientistas tratavam o alto grau de violência da humanidade como algo tipicamente nosso. É claro que todos sabiam que muitas espécies animais matam. Geralmente, porém, essa matança é dirigida contra outras espécies, contra presas. Individualmente, os animais - na maioria das vezes macho competindo num contexto sexual - lutam com outros da mesma espécie. Entretanto, é típico que esse tipo de embate termine no momento em que um dos contendores se rende. Os cientistas achavam que somente os humanos iam deliberadamente atrás de membros de sua própria espécie para matá-los. Em nossas mentes, revestíamos a violência de nossa própria espécie com cultura e razão, dois atributos nitidamente humanos, e nos perguntávamos que forma de pecado original nos havia condenado a esse estranho hábito. De repente, deparamos com esse fato no mundo dos primatas. O ataque a Godi indicou que os chimpanzés podem ser uma segunda espécie que mata seus semelhantes de modo delibe­rado. Porém, que coisa estranha que essa segunda espécie seja a dos chimpanzés! Afinal, nenhuma espécie é mais intimamente aparentada conosco do que a dos chimpanzés.

Qual era o significado disso? Será que o sofrimento de Godi indicava uma seqüela compartilhada de nosso passado evolutivo? Será que isso implicava que a matança humana está enraizada na história pré-humana? Ou a morte de Godi teria sido uma aber­ração, uma raridade que só acontecia uma vez na vida, uma expressão desatinada de uma insanidade temporária de primatas?

O tempo iria dizer.

Os ataques mortíferos não foram o único tipo de comporta­mento sinistro que emergiu nesses primeiros anos de pesquisa de campo sobre chimpanzés. Os cientistas também começaram a notar exemplos de violência sexual.

Quando se trata de fazer sexo, uma fêmea chimpanzé normal­mente não é muito seletiva. Ela acha a maioria dos machos atraentes ou, pelo menos, tolerável. Contudo, há um tipo de relacionamento que a bloqueia por completo. Ela não gosta de cruzar com os seus irmãos pelo lado materno. Mesmo quando esses machos a cortejam com empenho, agitando ramos de árvore, olhando-a fixamente e assumindo posturas orgulhosas, a fêmea chimpanzé repele seus irmãos.

Normalmente, a relutância da fêmea em cruzar com seu irmão marca o fim do assunto. Entretanto, de vez em quando um irmão não suporta ser repelido. Ela resiste e o evita. Ele fica enraivecido. Sai atrás dela e, empregando seu tamanho maior e sua força superior, bate nela. Ela grita, depois foge e se esconde. Ele a encontra e ataca novamente. Dá-lhe murros e pancadas, prende-a no chão e não há nada que ela possa fazer. No fundo da floresta ocorre um estupro".

 (Relato extraído do livro "O Macho Demoníaco. As origens da Agressividade Humana" – Autores: Richard Wrangham & Dale Peterson. Editora Objetiva).

terça-feira, 2 de junho de 2009

PLATÃO E ARISTÓTELES - POESIA E FILOSOFIA


Platão x Aristóteles

            Platão concebia o conhecimento basicamente em duas dimensões: a dimensão do sensível e a dimensão do inteligível. A primeira refere-se às realidades do mundo captadas pelos nossos sentidos e a segunda refere-se ao mundo das idéias. A relação era existente em virtude de o mundo sensível ser apenas imagem do mundo das idéias, do mundo inteligível. Estabelecidas estas dimensões, Platão entendeu que a poesia habitava o reino das imagens, mero fruto da imaginação humana. Para Platão, tudo o que se baseava no imaginário degenerava, desvirtuava a realidade do modelo. Com esta consideração, o destino da poesia era a sua exclusão da cidade ideal. Esse destino está preconizado no capítulo X da República, no qual se apresenta a tese platônica de que a arte é imitação da aparência do real e, como tal, está afastada da verdade. Sendo a poesia uma arte, eis assim o seu destino.
            Em contrapartida, Aristóteles resgatou o mundo sensível. Ele entendeu que o nosso conhecimento só conta com o mundo sensível. Esta premissa abriu a porta para a aceitação da poética, como realidade que possibilita à natureza alcançar o seu objetivo, a sua finalidade. Na verdade, Aristóteles abriu espaço para que a poesia se tornasse autônoma, possibilitando ao homem uma realização que a natureza, por si, não era capaz de lhe proporcionar.
            Diante destas abordagens, são percebidas diferenças entre os dois pensadores.
            Na Poética de Aristóteles encontramos a Poesia e a Filosofia como disciplinas que tratam do fato universal, enquanto a História trata do fato particular. Detém-se a História no indivíduo, enquanto a Filosofia e a Poesia tratam das realidades que se aplicam a todos os indivíduos. Enquanto a História narra um fato particular, situado no tempo e no espaço, a Poesia procura imitar a realidade de modo a podermos identificar na sua imitação uma referência ao fato universal, do qual o fato narrado pela História é apenas um exemplo. A Filosofia, por sua vez, não narra o fato como também não o imita, antes procura explicá-lo logicamente, de modo que esta explicação sirva para toda e qualquer manisfestação do fato narrado ou imitado.
            A expressão de Aristóteles: "A arte imita a natureza" cabe bem para sintetizar a Poética. Partindo desta expressão, com a idéia de mímese em mente, a Poética pode ser conceituada como a arte que, através da imitação criativa, visando à purificação do homem, completa o trabalho da natureza, tornando o homem um ser melhor em face do trabalho inacabado pela natureza.

Willians Moreira