Páginas

terça-feira, 1 de janeiro de 2013

PREGADOR E ORADOR

 
            Via de regra, aos domingos, ouço uma prédica diferente; outras vezes, praticamente a mesma por pessoas diferentes. Prédicas iguais no que se trata de ideologia teológica e homilética. Neste último aspecto, diga-se de passagem, geralmente as prédicas são exemplos claros de que o usuário do púlpito é mesmo desabilitado ou inexperiente: Não há mesmo nenhuma perspectiva de que o tal tenha aprendido a lição mais rudimentar da disciplina da pregação. Isso sem falar sobre o aspecto da oratória.
            Uma vez ou outra, e isto superlativamente raro, presencio pregador que demonstra certa absorção de lições fundamentais sobre o uso do púlpito. Ultimamente, compareci a uma cerimônia, na qual um dos usuários do púlpito atuou relativamente melhor do que a grande maioria que presencio. O seu conteúdo estava meio denso, carregado de pesquisas, que, na verdade, serviram mais para preencher o seu tempo e impressionar ao público; menos para embasar o seu argumento. A plateia (Jo. 7:49) gostou; afinal, a retórica do paroleiro recebeu mais projeção do que o assunto tratado. Houve mesmo uma tentativa do pregador de se parecer com um grande orador. Lembrei-me, na ocasião, de Saul e Davi. Embora Davi tenha sido sábio o bastante para não usar a armadura de Saul, a ele oferecida pelo rei israelita. Final das contas: pregador ovacionado; e eu estupefato. Face a essas ocorrências, tenho procurado conscientizar-me de que a multidão, por conta de sua ignorância, contenta-se mesmo com o mínimo, mesmo que o pregador se apresente com a retórica da “armadura de Saul”.
            Pessoalmente, faço distinção entre ser pregador e ser orador. Desde que oratória é uma arte, penso que a prioridade de quem vai ao púlpito não é ser artista. Antes o púlpito é lugar de transmissão do conteúdo interpretado da revelação bíblica; não é lugar para apresentação artística. Usar o púlpito com este objetivo é desvirtuar a finalidade da pregação evangélica. Evidente que a oratória envolve mais do que o fator artístico; ela não apenas promove diversão e satisfação de gosto estético. Sua jurisdição também abrange o aspecto da intenção de informar e influenciar os ouvintes. Porém, estes fatores estão subjugados ao fator principal, que é satisfazer aos expectadores. Como toda arte, a oratória observa regras e técnicas. Na oratória, a observância destas realidades busca mesmo apurar as qualidades pessoais do orador, pois que, enquanto artista, busca mesmo a autosatisfação enquanto se apresenta.
            Ser pregador é ser transmissor do conteúdo bíblico. Neste particular, aquele que assim age, não deve priorizar o como se apresenta. Mas, acima de qualquer consideração, a preocupação do pregador deve voltar-se para o conteúdo do que transmite. O pregador esquece-se de si. A prioridade é o conteúdo bíblico. Se a prioridade for burilar a si próprio para se apresentar ao público passa a ser expressão de desejo de glória. E isto não cabe ao pregador. O objetivo deste é colocar os holofotes na revelação; não em si mesmo. Decorre disto que não se preocupa em se apresentar, mas antes em transmitir o melhor possível a mensagem da revelação. Seu objetivo não é entreter o ouvinte; antes, e acima de qualquer outro fator, busca levar o homem a se aproximar mais da divindade. A pregação direciona o homem à fé; a oratória em si direciona o homem ao próprio orador. A pregação faz brilhar a divindade; a oratória faz brilhar o orador. Quando vejo um pregador sendo ovacionado, preocupo-me bastante com o destino da pregação e o destino dos ouvintes.
            Deve ficar evidente aqui que não sou contrário à oratória. Sou contrário, sim, à ênfase esmerada que se dá à uma retórica, em detrimento do objetivo principal da pregação, que é o de levar vidas à mudança conforme os ditames bíblicos. Quando presencio um pregador, com certa entonação de voz, com certos movimentos do corpo, das mãos, do quadril, com gesticulação facial desconforme com o seu natural, buscando com isso causar no público um efeito a si favorável, percebo nisso o desejo humano de querer para si a glória. E quando se trata de pregador iniciante ou inexperiente, as extravagâncias  retóricas laboram contra ele próprio.
            Ao pregador permite-se-lhe o uso da retórica, sem jamais se permirtir ofuscar a sua missão de conduzir o ouvinte ao conhecimento da divindade.
Willians Moreira Damasceno